20.11.11

 

Geoge Orwell Escritor Político Consumado





Este consumado escritor político, George Orwell, pseudónimo escolhido por Eric Blair, talvez por razão de eufonia ou por imaginada facilidade de fixação na memória popular, desagradando-lhe sobremaneira o nome que lhe fora dado, como ele próprio confessava, pertencia, de facto, a um verdadeiro escol de pensadores do fenómeno político, conservando ainda hoje enorme prestígio e público leitor, apesar da ideologia a que aderira.



Na verdade, Orwell nunca deixou de raciocinar de forma autónoma e, quando se confrontou com a prática dos comunistas e outros revolucionários, na sua experiência de brigadista, em Espanha, na Catalunha, durante a Guerra Civil de 1936-39, aí acabou, para si, o equívoco com a utopia comunista, sem contudo perder a esperança num socialismo capaz de conviver e respeitar a democracia política, embora tivesse sempre permanecido um combativo crítico do Sistema Capitalista.



Nos dois livros político-alegóricos que escreveu (1984 e Animal Farm), depois da sua amarga experiência de combatente revolucionário, neles vazou toda a sua crítica à ideologia comunista, dita de vanguarda, então grandemente dominante, em Espanha e em França, principalmente, mas também com forte presença em muitas Universidades inglesas e americanas.



Estranhamente, a maioria dos intelectuais do seu tempo, com a sua actividade mais centrada em Paris, salvo raríssimas excepcões, com particular destaque para a figura de Raymond Aron, émulo permanente de Jean-Paul Sartre, desde os bancos do Liceu, creio, por conseguinte, antes dos anfiteatros da Sorbonne, alinharam com aquela espantosa perversão ideológica patrocinada, primeiro por Moscovo e depois por China, Cuba, Albânia e outras pátrias menores mas terrivelmente triunfantes do obscurantismo pseudo-revolucionário, durante as décadas de 60 e 70 do século passado.



Orwell, que nunca se remeteu exclusivamente ao papel de revolucionário de gabinete, procurando conhecer e sofrer a realidade, merece-nos, por isso mesmo, o nosso maior respeito, pela coragem intelectual demonstrada, quando, em grande isolamento, na sua família ideológica, ousou denunciar a mentira perversa que se escondia por trás da falsa utopia comunista.



Da sua coragem física, já tinha dado provas reais, com a sua passagem pelas Brigadas Internacionais, na Guerra Civil espanhola.



Como pensador original e excelente prosador da língua inglesa, legou-nos as obras que escreveu para o podermos comprovar.



Com rara percepção da perversão totalitária soviética, escreveu muitas frases lapidares, em que o seu pensamento político ficou bem ilustrado, como as que aqui relembro a propósito :



- One does not establish a dictatorship in order to safeguard a revolution; one makes the revolution in order to establish the dictatorship. The object of persecution is persecution. The object of torture is torture. The object of power is power. ( 1984 )



- Doublethink means the power of holding two contradictory beliefs in one’s mind simultaneously, and accepting both of them. ( 1984 )



- Man… is an animal that can act morally when he acts as an individual, but becomes unmoral when he acts collectively. ( Collected Essays, Journalism and Letters, vol. 4 )



- Man is the only creature that consumes without producing. ( Animal Farm )



- Napoleon had commanded that once a week there should be held something called a Spontaneous Demonstration. ( Animal Farm )



- It is only when you meet someone of a different culture from yourself that you begin to realize what your own beliefs are. ( The Road to Wigan Pier )



Este seu gosto pela frase bem esculpida, exímio cultor da língua inglesa, aliado à agudeza de pensamento que sempre evidenciou, faz com que seja um dos raros autores, politicamente oriundos da utopia revolucionária marxista, que, ainda hoje, continue a ser profusamente lido, estudado e debatido pelo mundo fora.



Enfrentar, denunciando, o pensamento totalitário pseudo-revolucionário, num tempo (1941-1945) em que até Estaline era considerado um aliado do Ocidente, não seria, por certo, posição cómoda de tomar.



Estava, por esse tempo, ainda bem sólida no Poder a burocracia soviética, que durante mais 40 anos haveria de continuar exercer o seu mando sobre metade da Europa.





Só a partir do meio da década de 80 do século passado, com a chegada ao Poder do «jovem» reformista Gorbachev ela começaria a abrir, no aparentemente sólido paredão da ideologia soviética, as primeiras mas inexoráveis fendas que conduziriam, a breve trecho, não sem surpresa, ao seu desmoronamento final.



Orwell foi dos escritores que primeiro, no Ocidente, ousaram desafiar e denunciar a perversão política operada no Leste e, por arrastamento, a concomitante ditadura mental imposta, fora do mundo soviético, por intelectuais de prestígio firmado nas suas áreas de estudo, mas, por regra, politicamente enfeudados a Moscovo.



Ser protagonista de semelhante feito, numa época em que o Comunismo Soviético repartia com os aliados a glória da sua esmagadora vitória sobre a Alemanha Nazi, tendo sido até o Exército Vermelho o primeiro a entrar em Berlim, não deve ter sido feito menor. Daí que lhe continuemos a votar um interesse especial.





De resto, muito bem andariam os actuais revolucionários ou indignados de todos os matizes, independentemente da razão que lhes assiste, em alguns domínios, em conviver com as obras de George Orwell, em lugar de procurarem exumar do «caixote do lixo da História», como gostavam de proclamar os seus antecessores políticos, a propósito de outras matérias que lhes eram desafectas, quando altivamente dissertavam, nos escritos ou manifestos que por toda a parte publicavam.



Afinal, dessa imensa produção doutrinária, com tantas obras editadas, então delirantemente exaltadas, nada ou muito pouco resta de válido, senão algumas peças como valor documental ou testemunhal de uma época conturbada da História da Humanidade, decerto não menos do que aquela que, no presente, dolorosamente atravessamos, com uma crucial diferença : é que se vivia então, ao contrário de agora, um tempo ainda prenhe de Esperança.



E para que esse derradeiro bem, a Esperança, possa renascer, muito mais gente vai ter de se empenhar num objectivo absolutamente vital que é o da regeneração urgente das nossas sociedades ocidentais ou toda a nossa vida se complicará perigosamente, para lá de qualquer sombria previsão.



AV_Lisboa, 20 de Novembro de 2011

13.11.11

 

As Canções Italianas como Seguro Antídoto da Depressão

Por circunstâncias particulares, tenho vindo a recuperar a memória de muitas canções italianas, especialmente as das décadas 50 e 60 do século passado, época dourada não só da música, como do cinema italiano, que conquistava adeptos pelo mundo inteiro. De tudo isto, hoje, mesmo na Europa, só resta uma pálida imagem.


Surgem, no entanto, aqui e ali, alguns sinais de revivescência desta memória, como disso é prova um Programa que o veterano Júlio Isidro mantém na RDP, aos Sábados de manhã, entre as 8 e as 9 horas, designado – e bem – « A Ilha dos Tesouros», pois de ilha, no vasto mar circundante de lixo musical que o domina, e de tesouros se trata ali, em tão agradável quanto oportuno Programa de Rádio.


A eterna discussão da subjectividade ou objectividade dos gostos não nos deve obnubilar a inteligência, recusando hierarquizar temas ou matérias de cunho artístico ou cultural.


Nem tudo o que a Humanidade vai criando ao longo da sua História tem idêntico valor e, pretender negar a excelência, só redunda em triunfo do reles, do banal, do grosseiro, mal de que a nossa época padece em extremo, de tanto querer relativizar, de tanto pretender proteger os mais fracos ou desfavorecidos, confundido realidades sociais, efémeras ou contingentes, com a realidade artística, em que os critérios devem ser distintos, reconhecendo e destacando o melhor, o superior, da mera vulgaridade dominante.


Na Música, clássica ou ligeira, o fenómeno assume contornos análogos e só influências espúrias conseguiram impor o quase completo banimento das músicas italiana e francesa das Estações de Rádio, públicas ou privadas.


Inundando as programações das Rádios com vulgaridades, com lixo musical, acaba por se criar um público sem memória e sem critério, que consome apaticamente aquilo que lhe apontam como moda ou como sucesso.


Quando comecei a despertar para o mundo da canção popular ligeira, aí pelo meio da década de 60 do século passado, a música italiana já estava em franco desaparecimento, como, de resto, o mesmo acontecia com a francesa, de excelentes intérpretes, com canções suportadas em textos de forte conteúdo social, político ou filosófico, que ainda hoje nos surpreendem, pela profundidade, pelo sentido, pela contundência.


As canções italianas, pelo contrário, seduziam-nos mais pela sua riqueza melódica, cheias de ritmo, muito alegres, com letras simples, algumas de profundo lirismo, que facilmente retínhamos, mesmo com parco conhecimento da língua.


Entretanto, a onda anglo-saxónica fazia a sua entrada fulgurante, na Europa com os Beatles, e nos EUA, com inúmeros grupos de Rock e de música Folk, Country, Blues, etc., então de assinalável qualidade.


Infelizmente, este domínio da música anglo-saxónica, com o Rock-and-Rol, à cabeça, foi-se acentuando, ao ponto de viciar o público ouvinte, num só tipo de música, que assim ia perdendo sensibilidade para sequer apreciar música de outra natureza ou origem.


Concomitantemente, o Rock-and-Rol, associado ao consumo das drogas entre multidões de fãs permanentemente em delírio, foi-se degradando à medida que subia a potência dos equipamentos electrónicos, viciando e enlouquecendo as insaciáveis multidões de adeptos, de critérios já fortemente embotados.


Assim o império do lixo musical, maioritariamente anglo-saxónico, veio a expulsar toda a restante música, amputando a memória de gerações de ouvintes de Rádio, que, agora, só em cantos especiais, quais refúgios ou exílios de qualidade, podem ter a oportunidade de avaliar e comparar as preferências actuais com as de outras épocas, afinal, não muito distantes da presente.


Esta pequena reflexão ocorreu-me, hoje, ao dar, de manhã, no facebook, com uma extraordinária canção da italiana Mina, uma verdadeira maravilha para todos os sentidos, pela tocante simplicidade da sua interpretação dessa fogosa canção intitulada «Tintarella di Luna», que tanto fez dançar e vibrar passadas gerações de adolescentes e jovens adultos, sobretudo, mas que, pela sua intrínseca qualidade, continua ainda a entusiasmar-nos, muitos anos depois.


Talvez resida aqui a base do critério para avaliar este tipo de matérias: aquilo que resiste ao tempo, que continua a emocionar-nos, a despertar em nós sentimentos estéticos ou reflexões de ordem intelectual, semelhantes ou diversos dos que um dia nos dominaram, isso tem valor inequívoco, que ultrapassa claramente o gosto ou o condicionalismo da época em que foi criado. Assim o vejo, pelo menos, na falta de outro critério mais seguro.


E aqui deixo este cândido conselho : se querem um remédio fácil, ao alcance da mão, para combater qualquer veleidade de infiltração de pensamento deprimente, nada como ouvir estas canções italianas dos anos 50 e 60 do contraditório, mas, cultural e artisticamente, riquíssimo século XX.


AV_Lisboa, 13 de Novembro de 2011

6.11.11

 

Desacertos Públicos de Vasco Pulido Valente




Pedindo emprestado ao nosso confrade do Portugal dos Pequeninos o excerto do artigo de Vasco Pulido Valente, sobre a discussão da possível redução do número de feriados nacionais, inserido no Público, creio que de 04.Nov.2011, transcrevo-o a seguir, para nele assinalar passagens assaz censuráveis, sobretudo se atendermos à qualificação académica de VPV e ao seu prestígio intelectual, com larga influência na opinião pública.


Neste seu escrito, a meu ver, naturalmente, VPV labora em erros vários, que cumpre assinalar e combater :


1- O 1.º de Dezembro foi inventado, sim, mas para restaurar a independência de Portugal; foi violento logo no seu início e levou a uma persistente guerra de 28 anos com Espanha; para nossa futura glória, todas as batalhas desta guerra se sagraram pela vitória das armas nacionais; no final delas, a Espanha reconheceu a independência portuguesa e assinou Tratado de Paz;



2 - O domínio filipino, ao contrário do que VPV afirma, não foi mera união dinástica, mas anexação política progressiva, particularmente indesejada pelo Povo miúdo e por algumas casas nobres.


Esta anexação foi-se tornando cada vez mais asfixiante, sobretudo com os dois últimos Filipes e, a prevalecer, conduziria inevitavelmente à subalternização, se não ao completo apagamento da cultura portuguesa, a começar no uso dominante, oficial, da Língua, que passaria a ser o castelhano, tal como sucedera na Galiza, uma vez perdida a soberania, de pronto submetida a forte castelhanização, ao longo dos séculos XIII e XIV, de tal forma que o galego nunca mais se desenvolveu, tendo mesmo sido apodado de língua de labregos, indigna de uso nos Tribunais e nas Casas Senhoriais.


Quando no século XIX os intelectuais galegos o pretenderam recuperar, encontraram inúmeras dificuldades, incluindo certo desinteresse do próprio Povo, já conformado com o uso do idioma castelhano.



3 – O o feriado de 10 de Junho deve obviamente permanecer, mesmo não se sabendo ao certo nem o dia nem o ano em que Luís de Camões morreu, havendo dúvidas entre 1579 e 1580, como tampouco se conhece a data do seu nascimento, estimando-se o ano de 1524, como um dos mais prováveis, por mero cálculo retrospectivo, a partir da carta de perdão de D. João III de Março de 1553, a libertá-lo da prisão, para logo de seguida Camões poder embarcar para a Índia. Sendo estes os escassos registos de alguma confiança de que dispomos e mesmo com todas estas incertezas, a data de 10 de Junho, foi há muito adoptada e consagrada para celebrar o Poeta, por excelência, Nacional, cuja vida atribulada se tomou como exemplo da gesta heróica dos Portugueses. Daí a sua adequação para Dia Nacional.


Certamente poucos povos no mundo se poderão orgulhar de ter o seu Dia Nacional associado ao nome de um dos seus mais ilustres escritores, que fixou, na forma literária mais apropriada de então, a Épica, a presença portuguesa no Mundo, com a narração do seu maior contributo para a Civilização, que foi a empresa dos Descobrimentos marítimos e a difusão da Língua Portuguesa nos cinco continentes do Globo.


Daí que, a haver um dia de Portugal, este seja porventura o mais exaltante de todos os demais possíveis.


4 – Por último, a concessão que VPV faz à manutenção do 25 de Abril como feriado nacional, independentemente do forte sentimento popular que a ele ainda permanece ligado, é pura contemporização sua, oportunista quanto baste, com certa Esquerda, tida por bem pensante, com a qual, de resto, VPV ainda conserva velhas «afinidades anti-fascistas»;


Lamento ter de tecer estas considerações a propósito de um artigo de um Professor de História, ainda por cima universitário, algo mitificado como intelectual rebarbativo, incorruptível, «enfant-terrible» de todas as maiorias governativas, mas a incoerência e a sem-razão demonstradas cobram seu preço.


VPV tem igualmente méritos e virtudes indesmentíveis, como Historiador e como comentador político, mas, obviamente, não goza de nenhuma infalibilidade e, por vezes, dá o flanco em toda a linha, como sucedeu aqui neste seu pequeno artigo, em que andou arredado das musas inspiradoras e também de algum, sempre necessário, bom senso.


Que as musas ora mal cortejadas, incluindo Calíope e Clio, as mais propícias nesta matérias, lhe façam companhia benéfica, em próximas ocasiões, é o desejo que todos lhe devemos formular, assim como um pouco menos de presunção e um pouco mais de humildade cívica tampouco lhe causariam dano.


Transcrição a seguir do excerto do artigo de Vasco Pulido Valente, publicado no Público de 04-11-2011 e divulgado na internet pelo confrade do blogue Portugal dos Pequeninos:


CINCO CHEGA


«Oficialmente, temos 14 feriados por ano em Portugal. De facto, temos mais e, até agora muito mais. Temos, primeiro, os feriados nacionais e, ao contrário de toda a gente, logo dois: o 1º de Dezembro e 10 de Junho. Tanto um como outro são meio inventados.


O 1º de Dezembro supostamente comemora o fim do domínio espanhol, que na realidade não foi um "domínio", mas só uma união de Estados que continuaram independentes, sob o mesmo rei.


O 10 de Junho, que para efeitos cerimoniais se chama "Dia de Camões, de Portugal e das Comunidades" (e dantes se chamava "Dia da Raça") é em princípio no dia da morte de Camões (que ninguém sabe quando morreu) e parece que se destina a exaltar disfarçadamente o Império, que já acabou e de que, num tempo de correcção política, se não pode falar. A seguir, temos feriados políticos: que são três.


Como era inevitável o 25 de Abril, a data da "revolução dos cravos", em que o regime celebra o fim da Ditadura e a presuntiva glória da sua obra; o 5 de Outubro, que introduziu uma República jacobina em Portugal e promoveu 15 anos de perseguição e violência; e, finalmente, o 1º de Maio, uma velha festa internacional dos trabalhadores, quando os trabalhadores eram "o proletariado".


O resto dos feriados - nove - são feriados religiosos, por vezes misturados com um pouco de nacionalismo, que seguem o calendário da Igreja Católica (mesmo o Carnaval, que, não por acaso, precede a Quaresma). Nenhum destes 14 feriados, excepto o Natal, suscita ainda qualquer espécie de fervor: nem os nacionais, nem os políticos, nem os religiosos. Servem só - em combinação com sábados, domingos, feriados municipais (que nada impede um qualquer município de estabelecer) e "pontes" - para aumentar o recreio e repouso da população em várias semanas por ano.


Com o compreensível propósito de acabar com isto, o Governo anunciou que iria diminuir o número de feriados; e a Igreja Católica, percebendo a sua fraqueza, ofereceu quatro. Ignoro o que o Governo pensa sobre o assunto, se pensa alguma coisa. Mas, razoavelmente, num Estado laico não devia haver mais do que três feriados religiosos (Natal, Ano Novo e Sexta-Feira Santa).


Como num Estado pequeno e indigente não devia haver mais do que dois feriados, por assim dizer, civis: o 25 de Abril, fatalmente, e, para não pôr muito nervosa a esquerda, o 1º de Maio. Cívica e espiritualmente passávamos muito bem com estes cinco.»


Vasco Pulido Valente, Público.»




AV_Lisboa, 06 de Novembro de 2011


This page is powered by Blogger. Isn't yours?